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Antonio Veronese- A liturgia da Cidadania- O Globo

Publié le 29 Juin 2012

Antonio Veronese- A liturgia da Cidadania- O Globo

April 15th, 2012 | | Edit Comments Off

Antonio Veronese

A Liturgia da Cidadania – Jornal do Brasil

É estratégia do governo isolar o MST , e para isso questiona sua legalidade e legitimidade em decorrência das ações adotadas pelo movimento nas últimas semanas. Recorre ao que George Orwell chamou de “doublespeak”, a tentativa de impor à sociiedade a verdade do poder,independentemente da verdade dos fatos. Infelizmente grande parcela da imprensa se deixou levar pela esperteza do Planalto e, como conseqüência,cresceram nas páginas as críticas ao MST.

Questionar a legalidade é a ante-sala do recrudescimento da repressão, seja pelo aparelho estatal, seja pelas milícias privadas.Com isso FHC abdica de sua função moderadora, ensaia um discurso autoritário, e deixa escapar o papel que a História lhe havia reservado. Servem a essa estratégia as acusações de que o MST quer transformar-se em partido político e adotar o exercício político stritu-senso, como se não fosse esse um direito de todos os segmentos da sociedade. Acusam-no também de desviar-se do seu caminho original, cometendo ações urbanas atentatórias ao patrimônio e à segurança públicos. Num país como o nosso, onde é crônico o desrespeito aos direitos humanos e o genocídio de menores e a fome são manchetes cotidianas, impõe-se à sociedade a busca da justiça , alencando-se entre suas legítimas prerrogativas, in-stremis, a desobediência civil.

E isso está claro para MST , pois o governo só cede e é diligente nas regiões em que o movimento adota estratégias mais contundentes. O MST tenta com isso levar, além dos limites da geografia agrária, os horizontes da luta que se propôs. Justificam essa estratégia a fundada descrença nos mecanismos constitucionais disponíveis, e a insensível atuação de FHC, que frustra, enquanto chefe de Estado, as expectativas que em torno dele existiam. Nos últimos quatro anos aumentaram a tensão e o confrontamento, e são inocentes as avaliações de que essa questão possa ser resolvida pela força. Para peãozada do MST a fome e a exclusão são ameaças muito mais concretas que os cassetetes da polícia ou as armas dos jagunços a serviço do latifúndio. Para essa imensa parcela de brasileiros “Sem-Esperanças” , o MST é um canto de sereias irresistível, e é difícil abrir mão da utopia dos seus acampamentos , onde se ensaia um micro-Estado mais justo, para retornar à dura realidade do Brasil contemporâneo. A própria dinâmica do processo não vislumbra o recuo dessa marcha autorizada por inquestionável lastro moral. São milhões de brasileiros sem um palmo de terra para plantar, enquanto do outro lado da cerca o mato cresce sem pressa de crescer, num país onde 1% dos habitantes possúe 46% das terras produtivas.

O MST, mais que a reforma agrária, propõe ao país uma reflexão sobre a anacronía de uma sociedade cuja lógica é a excludência de um terço de seus habitantes, portanto, uma sociedade de extrema perversidade. Provoca-nos também a exercer nosso ” devoir d’insolence”, instigando o renascimento entre nós da liturgia da cidadania.

Por tudo isso, o MST é mais relevante do que insinuam seus precipitados detratores.

O tempo, certamente, irá conferir-lhe sua real dimensão histórica.Graças à sua atuação e ousadia, temos hoje 5 milhões de brasileiros assentados, em área que excede às da Holanda e Bélgica somadas. Isso tudo sem dar tiro, ainda que tenha oferecido 1.600 vítimas fatais à sanha de seus algozes. O presidente a República e parte da imprensa, ao cobrarem do MST que se mantenha dentro dos parâmetros da lei, parecem esquecer-se que o” estado de necessidade” reescreve os normativos da lei, a eles modifica e, por fim, a eles se sobrepõe quando não resta outra alternativa à fome e ao desespero. A paz no campo não será obtida pela força da lei, mas pela serenidade da justiça.

antonio veronese

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